Olá amigos, inauguramos hoje mais
uma seção de nosso blog, chamada de “Dicas rápidas de Direito do Consumidor”. Sempre que houver um tema interessante (e de ordem prática) sobre Direito do Consumidor, iremos publicar aqui.
Hoje vamos tratar sobre contas de
água em atraso.
Pedimos desculpas
antecipadamente, mas está sendo impossível responder às dezenas de e-mails que
chegam todos os dias. Informamos também que, por força de impedimento legal, não
podemos responder perguntas sobre casos concretos.
Imagine a seguinte situação:
Você compra a casa de João.
Ocorre que João vendeu a casa,
mas deixou um débito de três meses da conta de água.
A concessionária ingressou com
uma ação de cobrança contra você, alegando que, como comprou a casa, passou a
ser o devedor, considerando tratar-se de obrigação propter rem.
Para piorar o cenário, a
concessionária suspende o fornecimento da água.
Agiu de forma correta a concessionária de água?
NÃO. O débito de água é de
natureza pessoal, não se vinculando ao imóvel.
Não se trata, portanto, de
obrigação propter rem.
Desse modo, você não pode ser
responsabilizado pelo pagamento de serviço de fornecimento de água utilizado
por outra pessoa (em nosso exemplo, João).
Nesse sentido, decidiu
recentemente a 1ª Turma do STJ: AgRg no REsp 1.313.235-RS, Rel. Min. Napoleão
Nunes Maia Filho, julgado em 20/9/2012.
Obs: esse raciocínio pode ser aplicado também para os casos de
fornecimento de energia elétrica, de telefone fixo ou de TV a cabo.
A concessionária pode “cortar” a água (suspender o fornecimento do
serviço) nesse caso?
NÃO. Explico esse tema por
partes:
Regra:
Em regra, é possível que a
concessionária de serviço público interrompa a prestação do serviço, em caso de inadimplemento do usuário, desde que haja aviso prévio. Isso está
expressamente previsto no art. 6º, § 3º, da Lei n.° 8.987/95.
Algumas situações especiais em que a concessionária NÃO pode suspender
o fornecimento de água mesmo havendo atraso no pagamento:
1) Quando os débitos em atraso foram contraídos pelo morador anterior (STJ AgRg no AG 1399175/RJ);
2) Quando os débitos forem antigos (consolidados no tempo). Isso porque, segundo o STJ, o corte de serviços essenciais, como água e energia elétrica, pressupõe o inadimplemento de conta regular, relativa ao mês do consumo, sendo inviável, pois, a suspensão do abastecimento em razão de débitos antigos (STJ AgRg no Ag 1351353/RJ);
3) Quando o débito for decorrente de fraude no medidor de consumo de água ou energia elétrica (vulgo “gato”), apurada unilateralmente pela concessionária. Nesse caso, deve a concessionária utilizar-se dos meios ordinários de cobrança (STJ AgRg no AREsp 101.624/RS), considerando que será necessário o consumidor defender-se dessa suposta fraude.
Desse modo, em nosso exemplo, a
concessionária não poderia cortar a água da sua casa.
Na contestação, você poderia invocar o Código de Defesa do Consumidor?
Aplica-se o CDC ao serviço de fornecimento de água, esgoto e energia elétrica?
SIM. Posição tranquila do STJ.
O que o juiz deveria fazer com a ação proposta pela concessionária
contra você?
Deveria extinguir o processo sem
resolução do mérito, considerando que você é parte ilegítima (art. 267, VI, do
CPC).
Última pergunta:
O que é uma obrigação propter rem?
Consiste em uma obrigação que se
vincula a uma coisa, acompanhando-a (daí ser também conhecida como obrigação
ambulatória).
Se a obrigação é propter rem, a pessoa assume uma prestação
(obrigação de dar, fazer ou não fazer) em razão da aquisição de um direito
real. Ex: “A” compra uma casa e, por esse simples fato, passa a ser devedor do
IPTU relativo a esse imóvel, ainda que o débito seja anterior à compra.
Outro exemplo de obrigações propter rem são os direitos de
vizinhança.
As obrigações propter rem são também chamadas de
simbióticas, mistas ou híbridas porque possuem características tanto de direito
real como de direito pessoal.