Dizer o Direito

domingo, 9 de setembro de 2012

Candidata grávida, impossibilitada de participar da prova física do concurso, tem direito de fazê-la em outra data?



O STJ recentemente enfrentou a seguinte situação fática:
Determinada candidata inscreveu-se no concurso de escrivã da Polícia Civil.
Foi aprovada nas fases anteriores do certame e convocada para o Exame de Capacidade Física.
Ocorre que essa candidata estava no 6º mês de gravidez e, assim, não podia realizar o teste.
No dia da prova física, a candidata compareceu até o local marcado, mas não realizou os testes, sendo, então, eliminada.
A candidata impetrou mandado de segurança no Tribunal de Justiça, que denegou a medida, fazendo com que a impetrante interpusesse recurso ordinário constitucional ao STJ (art. 105, II, b, CF/88).

Principais pontos abordados pelo STJ no julgamento do recurso:

1ª) Houve perda do objeto do mandado de segurança pelo fato do resultado final do concurso já ter sido homologado e somente agora o writ estar sendo julgado?
NÃO. O STJ tem entendimento firmado no sentido de que, quando a ação busca aferir a suposta ilegalidade de uma das etapas do concurso, a homologação final deste não conduz à perda de objeto do mandamus.
Assim, o exame da legalidade do ato apontado como coator em concurso público não pode ser subtraído do Poder Judiciário em decorrência pura do encerramento do certame, o que
tornaria definitiva a ilegalidade ou abuso de poder alegados.

2ª) Quais são os requisitos que devem ser respeitados para que o exame de capacidade física seja válido em concursos públicos?
a)      O exame físico deve estar previsto em lei;
b)      Os critérios de avaliação devem ser objetivos;
c)       Deve haver possibilidade de revisão do resultado obtido pelo candidato.

3ª) É possível que a organização do concurso conceda tratamento diferenciado, na prova física, a candidato que apresenta alterações fisiológicas temporárias mesmo sem que haja previsão no edital para isso?
NÃO. É firme a jurisprudência do STJ no sentido de que o Edital é a Lei do Concurso. Nesse sentido, havendo previsão editalícia de que não serão levados em consideração os casos de alteração psicológica e/ou fisiológica temporários, e de que não será dispensado tratamento diferenciado em função dessas alterações, não há como possibilitar a realização de uma segunda prova de aptidão física (AgRg no RESP 798213/DF) Ex: pé quebrado.

4º) E no caso da grávida?
No caso de gravidez, a 6ª Turma do STJ, apesar de relembrar que possui o entendimento acima exposto, afirmou que havia circunstâncias que justificavam a adoção de solução diversa.
É que, não obstante conste do resultado que a candidata fora eliminada do certame porque faltou ao teste físico, ao que se tem dos autos, a candidata efetivamente compareceu na data da realização da prova.
Ademais, conquanto haja previsão no edital no sentido de que "Nenhum candidato merecerá tratamento diferenciado em razão de fatos (alterações patológicas ou fisiológicas — contusões, luxações, fraturas, etc — ou outras situações), ocorridos antes do exame ou durante a realização de qualquer das provas do exame, que o impossibilitem de submeter-se às provas do Exame Físico ou diminua sua capacidade física ou orgânica", não há previsão no edital no sentido de que a candidata será eliminada em virtude de gravidez que, vale frisar, não constitui doença e, pois, alteração patológica, tampouco alteração fisiológica que tenha natureza assemelhada à daquelas elencadas, de modo a autorizar a interpretação analógica adotada pela comissão do concurso.
Por outro lado, a proteção constitucional à maternidade e à gestante não somente autoriza, mas até impõe a dispensa de tratamento diferenciado à candidata gestante sem que isso importe em violação ao princípio da isonomia, máxime se não havia expressa previsão editalícia proibitiva referente à gravidez.

Vale ressaltar que a Ministra Relator afirmou ainda que o STF possui jurisprudência no sentido de que a gestação constitui motivo de força maior que impede a realização da prova física, cuja remarcação não implica em ofensa ao princípio da isonomia, como se colhe no seguinte julgado (nesse sentido: AI 825545 AgR, Relator Min. Ricardo Lewandowski, Primeira Turma, julgado em 13/04/2011).


Em resumo, o que decidiu o STJ:
A gestação constitui motivo de força maior que impede a realização da prova física, cuja remarcação não implica em ofensa ao princípio da isonomia.
A proteção constitucional à maternidade e à gestante não somente autoriza, mas até impõe a dispensa de tratamento diferenciado à candidata gestante sem que isso importe em violação ao princípio da isonomia, especialmente se inexiste expressa previsão editalícia proibitiva referente à gravidez.
RMS 31.505-CE, Rel. Min. Maria Thereza de Assis Moura, julgado em 16/8/2012.

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