Olá amigos do Dizer o Direito,
Cada vez mais se chega à conclusão de
que aquilo que está escrito no texto da lei é apenas o ponto de partida, não
sendo quase sempre o ponto de chegada para a correta interpretação da norma.
Desse modo, seja para atuar no
cotidiano forense, seja para ter êxito nos concursos públicos, é indispensável conhecer
aquilo que o STJ e o STF leram e que não se encontra expressamente escrito no
texto legal.
Atualmente, para conhecer realmente o
Direito, é fundamental acompanhar a jurisprudência.
Vamos fazer o seguinte exercício.
Respondam a essas duas perguntas apenas com base no texto legal e depois vejam
o que foi decidido pela Terceira Turma do STJ.
As perguntas são as seguintes:
1)
Dois irmãos podem adotar um menor?
Exemplo
hipotético: Júlia (25 anos) e Pedro (30 anos) são irmãos e, por serem
solteiros, ainda moram juntos. Júlia e Pedro criam, há alguns anos, um menor
que encontraram na porta de sua casa. Júlia e Pedro podem adotar esse menor?
Se quiser saber a resposta trazida pelo
texto da Lei, consulte o § 2º do art. 42 do ECA.
2)
Pedro (30 anos) cria o órfão Huguinho (4 anos) desde que ele nasceu como se
fosse seu filho biológico, dando carinho, afeto, cuidados materiais etc. As
pessoas que conhecem Pedro, sabem que ele considera Huguinho como seu filho.
Antes que pudesse ingressar com um pedido de adoção de Huguinho, Pedro vem a
falecer. É possível que os sucessores de Pedro ingressem com uma ação para que Huguinho
seja adotado como filho de Pedro, mesmo ele já tendo morrido sem ter iniciado o
procedimento?
Se quiser saber a resposta trazida pelo
texto da Lei para essa pergunta, consulte o § 6º do art. 42 do ECA.
Agora vamos ver o que o STJ decidiu em
um caso análogo a esses exemplos que demos.
Dois
irmãos podem adotar um menor?
Exemplo
hipotético: Júlia (25 anos) e Pedro (30 anos) são irmãos e, por serem
solteiros, ainda moram juntos. Júlia e Pedro criam, há alguns anos, um menor que
encontraram na porta de sua casa. Júlia e Pedro podem adotar esse menor?
Segundo
o texto do ECA
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Segundo
entendeu o STJ
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NÃO
De acordo com o texto do ECA, a
adoção conjunta somente pode ocorrer caso os adotantes sejam casados ou vivam
em união estável (§ 2º do art. 42).
Excepcionalmente, a Lei permite que adotem
se já estiverem separados, mas desde que o estágio de convivência com o menor
tenha começado durante o relacionamento amoroso (§ 4º do art. 42).
Art. 42 (...)
§ 2º Para adoção conjunta, é
indispensável que os adotantes sejam casados civilmente ou mantenham união
estável, comprovada a estabilidade da família.
§ 4º Os divorciados, os
judicialmente separados e os ex-companheiros podem adotar conjuntamente,
contanto que acordem sobre a guarda e o regime de visitas e desde que o
estágio de convivência tenha sido iniciado na constância do período de
convivência e que seja comprovada a existência de vínculos de afinidade e
afetividade com aquele não detentor da guarda, que justifiquem a
excepcionalidade da concessão.
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SIM
A interpretação do ECA deve atender
ao princípio do melhor interesse do menor.
O conceito de núcleo familiar estável
não pode ficar restrito às fórmulas clássicas de família, devendo ser
ampliado para abarcar a noção plena de família, apreendida nas suas bases
sociológicas.
O simples fato de os adotantes serem casados
ou companheiros, apenas gera a presunção de que exista um núcleo familiar
estável, o que nem sempre se verifica na prática.
Desse modo, o que importa realmente para
definir se há um núcleo familiar estável que possa receber o menor são os elementos
subjetivos, que podem ou não existir, independentemente do estado civil das
partes.
Esses elementos subjetivos são
extraídos da existência de laços afetivos; da congruência de interesses; do compartilhamento
de ideias e ideais; da solidariedade psicológica, social e financeira, fatores
que somados, e talvez acrescidos de outros não citados, possam demonstrar o animus de viver como família e deem
condições para se associar, ao grupo assim construído, a estabilidade
reclamada pelo texto de lei.
Nesse sentido, a chamada família anaparental
(ou seja, sem a presença de um ascendente), quando constatado os vínculos
subjetivos que remetem à família, merece o reconhecimento e igual status daqueles grupos familiares
descritos no art. 42, §2º, do ECA.
Em suma, o STJ relativizou a
proibição contida no § 2º do art. 42 e permitiu a adoção por parte de duas
pessoas que não eram casadas nem viviam em união estável. Na verdade, eram
dois irmãos (um homem e uma mulher) que criavam um menor há alguns anos e,
com ele, desenvolveram relações de afeto.
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Adoção
póstuma (adoção nuncupativa)
Adoção póstuma é aquela que se aperfeiçoa mesmo tendo o
adotante já falecido.
Essa possibilidade é trazida pelo art. 42, § 6º do ECA:
Art. 42 (...)§ 6º A adoção poderá ser deferida ao adotante que, após inequívoca manifestação de vontade, vier a falecer no curso do procedimento, antes de prolatada a sentença.
Requisitos para que ocorra a adoção
póstuma:
Segundo
o texto do ECA
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Segundo
a jurisprudência do STJ
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a)
O adotante, ainda em vida, manifesta inequivocamente a
vontade de adotar aquele menor;
b)
O adotante, ainda em vida, dá início ao procedimento
judicial de adoção;
c)
Após iniciar formalmente o procedimento e antes de ele
chegar ao fim, o adotante morre.
Nesse caso, o procedimento poderá
continuar e a adoção ser concretizada mesmo o adotante já tendo morrido.
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Se o adotante, ainda em vida,
manifestou inequivocamente a vontade de adotar o menor, poderá ocorrer a
adoção post mortem mesmo que não
tenha iniciado o procedimento de adoção quando vivo.
O que pode ser
considerado como manifestação inequívoca da vontade de adotar?
a)
O adotante trata o menor como se fosse seu filho;
b)
Há um conhecimento público dessa condição, ou seja, a
comunidade sabe que o adotante considera o menor como se fosse seu filho.
Nesse caso, a jurisprudência permite
que o procedimento de adoção seja iniciado mesmo após a morte do adotante, ou
seja, não é necessário que o adotante tenha começado o procedimento antes de
morrer.
No julgado deste informativo, o STJ
reafirma esse entendimento.
A Min. Nancy Andrighi explica que o
pedido de adoção antes da morte do adotante é dispensável se, em vida, ficou
inequivocamente demonstrada a intenção de adotar:
“Vigem
aqui, como comprovação da inequívoca vontade do de cujus em adotar, as mesmas
regras que comprovam a filiação socioafetiva: o tratamento do menor como se
filho fosse e o conhecimento público dessa condição.
O
pedido judicial de adoção, antes do óbito, apenas selaria com o manto da
certeza, qualquer debate que porventura pudesse existir em relação à vontade
do adotante. Sua ausência, porém, não impede o reconhecimento, no plano
substancial, do desejo de adotar, mas apenas remete para uma perquirição
quanto à efetiva intenção do possível adotante em relação ao
recorrido/adotado.”
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A decisão do STJ (em um caso parecido
com os nossos exemplos) foi tomada pela Terceira Turma, no REsp 1.217.415-RS, cuja
Relatora foi a excelente Min. Nancy Andrighi, julgado em 19/6/2012.
Trata-se de precedente importantíssimo e que será, com toda
a certeza, cobrado nas próximas provas de concurso.