A Constituição Federal de 1988 prevê, em seu art. 226, § 8º:
§ 8º - O Estado assegurará a assistência à família na pessoa de cada um dos que a integram, criando mecanismos para coibir a violência no âmbito de suas relações.
No mesmo sentido deste comando
constitucional, o Estado Brasileiro, com o intuito de coibir a violência contra
a mulher, assinou dois importantes tratados internacionais:
- Convenção sobre a Eliminação de Todas as Formas de Violência contra a Mulher;
- Convenção Interamericana para Prevenir, Punir e Erradicar a Violência contra a Mulher (“Convenção de Belém do Pará).
A fim de regulamentar o §8º do
art. 226 da CF/88 e dar maior efetividade aos compromissos internacionais
assumidos em defesa da mulher, foi editada a Lei n.° 11.340/2006, conhecida como “Lei
Maria da Penha”.
A referida Lei cria mecanismos
para coibir a violência doméstica e familiar contra a mulher.
Indaga-se então:
Qual é o conceito legal de violência doméstica?
Quais os casos em que é possível configurar-se violência doméstica?
Violência doméstica e
familiar contra a mulher é:
-
qualquer ação ou omissão
-
baseada no gênero
-
que cause
-
morte,
-
lesão,
-
sofrimento físico,
-
sofrimento sexual ou
-
sofrimento psicológico e
-
dano moral ou
-
dano patrimonial
-
à mulher
-
e que ocorra:
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I - no âmbito da unidade
doméstica; ou
Unidade doméstica é o espaço de
convívio permanente de pessoas, com ou sem vínculo familiar, inclusive as
esporadicamente agregadas.
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II - no âmbito da família; ou
Família aqui deve ser compreendida
como a comunidade formada por indivíduos que são ou se consideram
aparentados, unidos por laços naturais, por afinidade ou por vontade
expressa.
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III - em qualquer relação
íntima de afeto, na qual o agressor conviva ou tenha convivido com a
ofendida, independentemente de coabitação.
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Algumas perguntas decorrentes
deste conceito, que está previsto no art. 5º da Lei:
1) É possível a aplicação da Lei Maria da Penha para a violência praticada
por irmão contra irmã, ainda que eles nem mais morem sob o mesmo teto?
SIM,
é possível, com base no inciso III acima exposto.
Ressalte-se,
mais uma vez, que, para a configuração de violência doméstica não precisa,
necessariamente, que haja coabitação (Quinta Turma. REsp 1.239.850-DF, Rel.
Min. Laurita Vaz, julgado em 16/2/2012).
2) A Lei Maria da Penha pode ser aplicada para namorados?
SIM.
A Terceira Seção do STJ vem firmando entendimento jurisprudencial de que é
possível a aplicação da Lei nº 11.340/2006 à agressão cometida por ex-namorado.
Em
tais circunstâncias, há o pressuposto de uma relação íntima de afeto a ser
protegida, por ocasião do anterior convívio do agressor com a vítima, ainda que
não tenham coabitado.
(HC
181.217/RS, Rel. Ministro Gilson Dipp, Quinta Turma, julgado em 20/10/2011)
Esta Lei pode ser aplicada a agressor que não se conforma com o término
do namoro:
Incide
a aplicação da Lei n. 11.340/2006 (Lei Maria da Penha) uma vez que a vítima
grávida mantinha íntima relação com o agressor, que vinha praticando agressões
físicas por não se conformar com o término do namoro, sendo ele o suposto pai.
Assim, competente a Justiça comum para processar e julgar a questão.
CC
92.591-MG, Rel. Min. Felix Fischer, julgado em 5/12/2008.
Mas cuidado: não é qualquer namoro que se enquadra na Lei Maria da
Penha:
Como
o art. 5º da Lei n.°
11.340/2006 dispõe que a “violência doméstica” abrange qualquer relação íntima
de afeto e dispensa a coabitação, cada demanda deve ter uma análise cuidadosa,
caso a caso. Deve-se comprovar se a convivência é duradoura ou se o vínculo
entre as partes é eventual, efêmero, uma vez que não incide a lei em comento nas
relações de namoro eventuais.
(CC
91.979-MG, Rel. Min. Maria Thereza de Assis Moura, julgado em 16/2/2009)
3) Por fim, a Lei Maria da Penha pode ser aplicada para a agressão perpetrada
por um homem contra a sua cunhada?
SIM.
Trata-se da hipótese prevista no inciso II, considerando que a cunhada é
parente por afinidade do agressor.
Assim,
já decidiu o STJ:
(...)
2. Na espécie, apurou-se que a Vítima, irmã
da companheira do Acusado, vivendo há mais de um ano com o casal sob o mesmo
teto, foi agredida por ele.
3. Nesse contexto, inarredável concluir pela
incidência da Lei n.º 11.343/06 (rectius: Lei n.°
11.340/2006), tendo em vista a ocorrência de ação baseada no gênero causadora
de sofrimento físico no âmbito da família, nos termos expressos do art. 5.º,
inciso II, da mencionada legislação.
4. "Para a configuração de violência
doméstica, basta que estejam presentes as hipóteses previstas no artigo 5º da
Lei 11.343/2006 (Lei Maria da Penha) [...]" (HC 115.857/MG, 6.ª Turma,
Rel. Min. JANE SILVA (Desembargadora Convocada do TJ/MG), DJe de 02/02/2009).
(...)
(HC 172634/DF, Rel. Ministra Laurita Vaz,
Quinta Turma, julgado em 06/03/2012)