quinta-feira, 8 de março de 2012
Decisão do STF sobre a Lei do Instituto Chico Mendes. Importante decisão sobre o procedimento de aprovação das medidas provisórias. Entenda. ATUALIZADA
quinta-feira, 8 de março de 2012
Sobre o que trata a Lei n.° 11.516/2007?
A Lei n.° 11.516/07 criou o Instituto Chico Mendes de Conservação da Biodiversidade (ICMBio), uma autarquia federal com a finalidade, dentre outras, de executar ações da política nacional de unidades de conservação da natureza.
De quem era esta atribuição anteriormente?
Esta atribuição, antes da criação do Instituto, era do IBAMA, que ficou com sua atuação concentrada na execução das políticas nacionais de meio ambiente, relativas ao licenciamento ambiental, o controle da qualidade ambiental, a autorização de uso dos recursos naturais ea fiscalização, monitoramento e controle ambiental.
A Lei n.° 11.516/07 foi resultado da conversão de uma medida provisória
A Lei n.° 11.516/07 resultou da conversão da Medida Provisória nº 366, de 2007.
Em outros termos, o Presidente da República editou a MP 366/2007 e o Congresso Nacional a aprovou, convertendo-a na referida Lei.
ADI 4029 proposta pela Associação dos Servidores do IBAMA
A Associação Nacional dos Servidores do IBAMA (ASIBAMA nacional) ingressou com uma ação direta de inconstitucionalidade contra esta Lei n.°11.516/07 (ADI 4029).
O que a referida Associação alegava na ADI
- Inconstitucionalidade formal da Lei pela violação do devido rito constitucional de aprovação das medidas provisórias e por não estarem preenchidos os pressupostos de urgência e relevância que justificam a edição de medidas provisórias.
- Inconstitucionalidade material da Lei por suposta ofensa ao art. 225 da CF.
A referida Associação tinha legitimidade para propor a ADI?
O STF decidiu que sim. Entendeu-se que ela se enquadrava no conceito de “entidade de classe de âmbito nacional”, previsto no inciso IX do art. 103 da CF.
O Relator afirmou que não se recomenda uma exegese demasiadamente restritiva do conceito de “entidade de classe de âmbito nacional“. A participação da sociedade civil organizada nos processos de controle abstrato de constitucionalidade deve ser estimulada em vez de limitada.
Rejeitada a suposta inconstitucionalidade material da Lei
A
Associação autora da ADI alegava a inconstitucionalidade material
da Lei. Sustentava que a criação do Instituto Chico Mendes vulnerou e
fracionou o órgão executor do Sistema Nacional do Meio Ambiente
(SISNAMA), afrontando, assim, o art. 225, § 1º, da Constituição, no qual
está previsto o dever do Estado de proteger o meio ambiente; além
disso, haveria violação aos princípios da proporcionalidade e da
eficiência pela criação de nova entidade, aumentando o gasto público,
sem que se observasse a melhoria na execução da atividade administrativa
em relação aos serviços que já eram prestados pelo IBAMA.
O
STF rejeitou esta alegação, sob o argumento de que não cabe ao Pretório Excelso discutir a
implementação de políticas públicas, quanto mais quando não se observa
qualquer afronta às determinações constitucionais.
Inconstitucionalidade formal pela violação ao art. 62, § 9º da CF/88
Como já dito, a Lei n.° 11.516/07 resultou da conversão da Medida Provisória nº 366, de 2007.
A Associação alegou que, durante o processo de aprovação da MP, não foi observado o disposto no art. 62, § 9º da CF/88:
Art. 62 (...)
§ 9º Caberá à comissão mista de Deputados e Senadores examinar asmedidas provisórias e sobre elas emitir parecer, antes de serem apreciadas, emsessão separada, pelo plenário de cada uma das Casas do Congresso Nacional.
O Congresso Nacional possui a Resolução n.° 1,de 2002, que:
Dispõe sobre a apreciação, pelo Congresso Nacional, das Medidas Provisórias a que se refere o art. 62 da Constituição Federal, e dá outras providências.
Segundo o art. 5º da Resolução n.° 1, a comissão mista, de que trata o § 9º do art. 62 da CF/88, terá o prazo de 14 dias para emitir parecer sobre a medida provisória.
O § 2º do art. 6º da Resolução afirma que, esgotado o prazo de 14 dias, o processo será encaminhado à Câmara dos Deputados, que passará a examinar a Medida Provisória. Assim, mesmo que a comissão mista não emita parecer, a Resolução do Congresso determina que o processo legislativo continue, passando a Câmara dos Deputados a examinar a matéria. Nesta hipótese, a Comissão Mista pode, conforme determina a Resolução, emitir o parecer, por meio de seu Relator, no Plenário da Câmara dos Deputados.
No caso da MP 366/2007 foi justamente o que aconteceu.
Como a comissão mista não apresentou o parecer no prazo de 14 dias, a MP seguiu para apreciação da Câmara e o Relator emitiu parecer sobre a Medida Provisória diretamente perante o Plenário. Perceba que não foi a comissão mista quem elaborou o parecer, mas tão somente o Relator, de forma individual.
A MP 366/2007 foi, então, aprovada pelo Congresso e se transformou na Lei n.° 11.516/07.
O procedimento adotado, no caso, foi inteiramente de acordo com a Resolução n.° 1/2002. No entanto, indaga-se: esta previsão de o parecer ser emitido apenas pelo Relator está de acordo com o § 9º do art. 62 da CF/88?
NÃO. O Relator, Min. Luiz Fux, entendeu que a Resolução n.° 1/2002, ao dispensar o parecer da Comissão Mista, contentando-se com o parecer individual do Relator, violou o § 9º do art. 62 da CF/88. Vejamos o que disse o eminente Ministro:
A magnitude das funções das Comissões Mistas no processo de conversão de Medidas Provisórias não pode ser amesquinhada. Procurou a Carta Magna assegurar uma reflexão mais detida sobre o ato normativo primário emanado pelo Executivo, evitando que a apreciação pelo Plenário seja feita de maneira inopinada. Percebe-se, assim, que o parecer da Comissão Mista, em vez de formalidade desimportante, representa uma garantia de que o Legislativo seja efetivamente o fiscal do exercício atípico da função legiferante pelo Executivo.
Em razão disso, há que se reconhecer, ainda que em caráter incidental, a inconstitucionalidade dos dispositivos da Resolução supracitada que dispensam a prolação de parecer por parte da Comissão Mista, não sendo suficiente sua elaboração por parlamentar Relator.
Efeitos da decisão de inconstitucionalidade proferida:
Efeitos do julgamento de mérito de uma ADI:
Regra: efeitos EX TUNC (retroativos)
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Excepcionalmente o STF pode, pelo voto de, no mínimo 8 Ministros (2/3):
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* restringir os efeitos da declaração; ou
* decidir que ela só tenha eficácia a partir de seu trânsito em julgado; ou
* de outro momento que venha a ser fixado.
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Desde que haja razões de:
* segurança jurídica ou;
* excepcional interesse social
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No julgamento que estamos analisando, o STF, no dia 07/03/2012 (quarta-feira), já havia decidido que atribuir efeitos retroativos (ex tunc) à decisão iria causar efeitos nocivos à sociedade.
Mencionou-se que o meio ambiente, direito fundamental de terceira geração, previsto no art. 225 da Constituição, ficaria desprotegido se fosse declarada inconstitucional, com efeitos retroativos, a criação do Instituto Chico Mendes, considerando que ele está em funcionamento desde 2007 e que os atos por ele praticados poderiam ser questionados (ex: multas). Disse o Ministro:
No que atine à não emissão de parecer pela Comissão Mista parlamentar, seria temerário admitir que todas as Leis que derivaram de conversão de Medida Provisória e não observaram o disposto no art. 62, § 9º, da Carta Magna, desde a edição da Emenda nº 32 de 2001, deveriam ser expurgadas ex tunc do ordenamento jurídico. É inimaginável a quantidade de relações jurídicas que foram e ainda são reguladas por esses diplomas, e que seriam abaladas caso o Judiciário resolvesse aplicar, friamente, a regra da nulidade retroativa.
Por isso, no dia 07/03/2012 (quarta-feira), foi declarada a inconstitucionalidade da Lei nº 11.516/07, não se pronunciando, contudo, a sua nulidade pelo prazo de 24 (vinte e quatro) meses.
Nesse prazo, o Congresso Nacional deveria aprovar nova Lei, de teor semelhante, que impediria a solução de continuidade na existência do Instituto Chico Mendes. Em contrapartida, findo esse prazo, o referido diploma perderia sua eficácia.
Questão de ordem apresentada pela AGU e mudança na decisão proferida (atualizada)
Na data de hoje, 08/03/2012, ou seja, um dia após o julgamento acima relatado, a AGU apresentou questão de ordem na ADI julgada.
O que a AGU alegou na questão de ordem? Afirmou que, se fosse mantida a decisão do STF de reconhecer a inconstitucionalidade dos arts. 5°, caput e 6°, §§ 1° e 2° da Resolução n.° 1, do Congresso haveria um caos e uma tremenda insegurança jurídica, considerando que cerca de 500 leis em vigor (resultado de conversão de medidas provisórias) foram aprovadas segundo este procedimento, dentre elas a do Bolsa Família e a do Minha Casa Minha Vida. Além disso, há inúmeras medidas provisórias que estão tramitando no Parlamento e que se encontram na mesma situação. Logo, centenas de atos normativos relevantes seriam questionados no Supremo por conta deste entendimento.
O Plenário do STF acolheu a questão de ordem e declarou que a declaração de inconstitucionalidade dos arts. 5°, caput e 6°, §§1° e 2° da Resolução n.° 1, do Congresso Nacional somente valerá de agora em diante. Em outros termos, as medidas provisórias convertidas em lei sem o parecer da comissão mista de que trata o § 9º do art. 62 da CF/88 não vão ser declaradas formalmente inconstitucionais. A partir desta decisão, no entanto, todas as medidas provisórias deverão atender a esta exigência constitucional.
Confira-se como ficou o resumo da decisão na questão de ordem:
O que a AGU alegou na questão de ordem? Afirmou que, se fosse mantida a decisão do STF de reconhecer a inconstitucionalidade dos arts. 5°, caput e 6°, §§ 1° e 2° da Resolução n.° 1, do Congresso haveria um caos e uma tremenda insegurança jurídica, considerando que cerca de 500 leis em vigor (resultado de conversão de medidas provisórias) foram aprovadas segundo este procedimento, dentre elas a do Bolsa Família e a do Minha Casa Minha Vida. Além disso, há inúmeras medidas provisórias que estão tramitando no Parlamento e que se encontram na mesma situação. Logo, centenas de atos normativos relevantes seriam questionados no Supremo por conta deste entendimento.
O Plenário do STF acolheu a questão de ordem e declarou que a declaração de inconstitucionalidade dos arts. 5°, caput e 6°, §§1° e 2° da Resolução n.° 1, do Congresso Nacional somente valerá de agora em diante. Em outros termos, as medidas provisórias convertidas em lei sem o parecer da comissão mista de que trata o § 9º do art. 62 da CF/88 não vão ser declaradas formalmente inconstitucionais. A partir desta decisão, no entanto, todas as medidas provisórias deverão atender a esta exigência constitucional.
Confira-se como ficou o resumo da decisão na questão de ordem:
O Tribunal acolheu questão de ordem suscitada pelo Advogado-Geral da União, para, alterando o dispositivo do acórdão da Ação Direta de Inconstitucionalidade nº 4.029, ficar constando que o Tribunal julgou improcedente a ação, com declaração incidental de inconstitucionalidade do artigo 5º, caput, artigo 6º, §§ 1º e 2º, da Resolução nº 01/2002, do Congresso Nacional, com eficácia ex nunc em relação à pronúncia dessa inconstitucionalidade, contra os votos dos Senhores Ministros Marco Aurélio e Cezar Peluso (Presidente), que julgavam procedente a ação. Impedido o Senhor Ministro Dias Toffoli. Ausente, justificadamente, o Senhor Ministro Joaquim Barbosa. Plenário, 08.03.2012.
Em suma, no julgamento da questão de ordem hoje (08/03), o STF reviu a decisão de ontem (07/03) e chegou às seguintes conclusões:
- O parecer da comissão mista (previsto no § 9º do art. 62 da CF/88) é obrigatório apenas para as medidas provisórias editadas daqui para a frente, ou seja, somente para aquelas que forem assinadas e encaminhadas ao Congresso Nacional a partir de agora;
- As medidas provisórias que estão tramitando no Congresso Nacional não precisarão passar, obrigatoriamente, pela comissão mista e continuarão a ser regidas pelas regras da Resolução n.º 01, do Congresso Nacional, acima explicada;
- A Lei n.° 11.516/07, que criou o Instituto Chico Mendes de Conservação da Biodiversidade (ICMBio) foi considerada válida, tendo em vista que a inconstitucionalidade dos arts. 5°, caput e 6°, §§ 1° e 2° da Resolução n.° 1, do Congresso Nacional somente produz efeitos ex nunc (a partir de agora);
- Todas as leis aprovadas segundo a mesma tramitação da Resolução n.° 1 (ou seja, sem parecer obrigatório da comissão mista após o 14° dia) são válidas e não podem ser questionadas por esta razão.
Vale ressaltar que o pedido de questão de ordem não tem, normalmente,
esta força, este condão, de permitir a rediscussão do mérito da causa.
Como é sabido, a decisão de mérito no controle concentrado-abstrato de constitucionalidade (ADI, ADC, ADPF) é irrecorrível, salvo embargos
declaratórios. Não cabe nenhum outro tipo de recurso, conforme previsão
expressa nas respectivas leis (Lei 9.868/99: art. 26 e Lei 9.882/99: art. 12). No entanto, na prática, esta questão de ordem funcionou como um verdadeiro recurso dirigido ao mesmo órgão (Plenário do STF) ou como uma espécie de pedido de reconsideração.
Trata-se, portanto, de decisão sui generis, excepcionalíssima
e aparentemente inédita na história do Supremo Tribunal Federal brasileiro.
Durante os debates sobre a questão de ordem, o Min. Gilmar
Mendes chegou a afirmar:
“De fato, a situação é muito grave, talvez uma das mais graves com as quais já tenhamos nos deparado, tendo em vista que a dimensão vai muito além do que o caso que foi objeto de discussão”.
Este é um episódio que certamente entrará para os anais da Suprema Corte brasileira e para a história do controle de constitucionalidade no Brasil
Tão logo tenhamos mais informações sobre o assunto, disponibilizaremos para vocês.